sexta-feira, setembro 04, 2015

Deuses e Heróis

Conta-se que Escopas, homem nobre e importante da região grega da Tessália, pediu ao afamado poeta Simônides de Ceos que compusesse uma ode em louvor a suas vitórias – que podem ter sido no campo de batalha ou em competições atléticas; as fontes divergem. Tratava-se de uma prática comum na época: poetas eram solicitados a compor obras sobre o tema que lhes fosse proposto, recebiam por isso, e era assim que muitos deles ganhavam a vida. A ode deveria ser entoada num banquete que Escopas planejava oferecer. Chegado o dia, ao lhe ser pedido que apresentasse o poema, Simônides levantou-se com sua lira e cantou uma das mais belas odes já ouvidas na Tessália, celebrando as vitórias de seu anfitrião. (Não estranhem se uso "cantar" em vez de "declamar"; na época, os poemas eram realmente cantados, pois não se fazia distinção entre poesia e música.) Para obter um melhor efeito lírico, o poeta ornamentou a obra com menções aos feitos dos admiráveis gêmeos Castor e Pólux, filhos de Zeus e Leda, irmãos da célebre Helena de Esparta, mais conhecida como Helena de Troia.

Seria de se imaginar que qualquer homem razoável se sentisse honrado por ter seu nome citado lado a lado com os de tão insignes heróis, mas, infelizmente, Escopas era do tipo egocêntrico. Queria a admiração de seus convivas toda para si, e não estava disposto a partilhá-la, nem mesmo com os legendários filhos de Zeus, de modo que não lhe agradou o que estava ouvindo. Quando Simônides, tendo terminado de cantar, dirigiu-se a ele para receber sua recompensa, Escopas pagou-lhe metade da soma combinada, dizendo-lhe, em tom de troça, que cobrasse o restante de Castor e Pólux. Simônides, decepcionado e ofendido, retornou ao seu lugar em meio à zombaria geral dos convidados.

Pouco mais tarde, um dos servos de Escopas entrou no salão de banquete e avisou a Simônides que estavam lá fora dois jovens a cavalo, que diziam ter de lhe falar com urgência. Saindo, o poeta não encontrou ninguém à sua espera, mas repentinamente o teto do salão veio abaixo, matando Escopas e seus convidados. Depois de pedir ao servo mais detalhes sobre a aparência dos jovens que o haviam procurado, o desconcertado Simônides convenceu-se de que não eram outros senão os próprios Castor e Pólux. A história termina dizendo que os corpos dos comensais do banquete ficaram tão desfigurados, que seus familiares não conseguiam identificá-los para poder dar a cada um os ritos funerários devidos, mas Simônides lembrava o nome de cada um dos presentes e o exato lugar onde ele estava sentado, e, graças a isso, todos os corpos puderam ser identificados.

Essa bela história talvez não seja verídica (embora eu não a desacredite totalmente: considero uma rematada tolice duvidar de que maravilhas possam mesmo acontecer), mas, seja ou não, ela ilustra bem um fato curioso acerca dos grandes poetas da Antiguidade: suas vidas tendem a fundir-se com a própria mitologia que lhes servia de tema, de modo que para nós, hoje, eles acabam por ser figuras quase tão legendárias quanto os heróis cujos feitos celebravam. Assim foi com o maior de todos, Homero, a quem são atribuídas a Ilíada e a Odisseia, e com outros que vieram depois – entre eles Simônides, o protagonista de Deuses e Heróis.

Mary Renault, cujo Rei Morto, Rei Posto já tive oportunidade de comentar, conduz a nós, seus leitores, em outro mergulho na Antiguidade Clássica, embora, desta vez, a um período histórico posterior e bem diferente daquele em que tiveram lugar as façanhas do herói Teseu. Simônides viveu aproximadamente de 556 a 468 a.C., numa Grécia mais civilizada e de instituições já consolidadas, e, por consequência, uma Grécia que podia dedicar mais atenção às artes, fato que é bem retratado no romance. O que, é claro, não significa que as guerras tivessem ficado no passado – nem as guerras contra inimigos externos, no caso o Império Persa, nem as guerras locais, entre diferentes cidades-estado gregas, coisa que permeou praticamente toda a história da Grécia Antiga e impediu o êxito de diversas tentativas de unificação política entre os povos de língua e cultura helênicas. Simônides, por sinal, foi o autor do famoso epitáfio gravado no monumento erigido em homenagem a Leônidas e seus trezentos espartanos ("Ide dizer a Esparta, ó estranhos que passam / Que aqui, obedientes às suas leis, jazemos."), aliás, um dos poucos fragmentos de sua obra que chegaram até nós, infelizmente. Tampouco são conhecidos muitos detalhes de sua biografia, de modo que a autora teve de fazer o que fazia tão bem: mesclar a informação histórica disponível com o produto de sua própria imaginação. O livro é um mosaico de eventos factuais e fictícios e de personagens históricos e inventados, sendo que estes últimos não parecem menos convincentes que os primeiros, e a interação entre todos é perfeitamente plausível. Quer dizer, parte do que aqui lemos efetivamente aconteceu – e o restante poderia ter acontecido.

A narrativa segue um esquema semelhante ao de Rei Morto, Rei Posto: um Simônides já idoso, aproximando-se do final de uma carreira prestigiosa, parece sentir que é chegado o momento de contar suas memórias, e essa história tem início na ilha de Ceos (hoje Kea), uma das Cíclades. Seu pai, Leoprepes, era um homem de posses para os padrões da ilha e um de seus cidadãos mais proeminentes, o que não significa que não trabalhasse duramente, ou que seus filhos pudessem, em princípio, esperar da vida muito mais que isso. Para maior azar de Simônides, ele era o filho varão mais jovem, além de agraciado pela natureza com um tipo físico pouco admirado entre os ilhéus, e entre os gregos da etnia jônica em geral: baixo e magro, embora de boa constituição; pele morena e cabelos negros, sem falar num rosto não exatamente atraente, enquanto seu irmão, Teásides, era o jovem heleno perfeito sempre retratado por pintores e escultores – alto, loiro, belo e atlético. Só isso já teria bastado para definir o papel de cada um: Teásides era o filho de quem os pais esperavam que os enchesse de orgulho e trouxesse honra ao nome da família; já Simônides, se dependesse dos planos deles, nunca iria muito além de ser um trabalhador não remunerado nas lavouras e rebanhos do pai. Apesar disso, os dois irmãos se dão bem; na verdade, Teásides parece ser o único a dedicar a Simônides alguma atenção e afeto.

Durante a infância e início da adolescência, Simônides exerce a ocupação mais icônica possível para um menino grego: a de pastor. E, como todo pastor, tem por hábito cantar e tocar flauta para preencher as longas horas vazias vigiando os carneiros que pastam. É dessa forma que descobre seu talento, pois possui uma voz naturalmente afinada, e, tão importante quanto isso para um poeta da época, uma ótima memória. Entretanto, por muito tempo, ele guarda só para si sua ambição de ser poeta, e acaba por amargurar-se, já que, vivendo na rústica Ceos, e ainda sendo o filho desprezado de um pai severo e austero, realizar esse sonho parece impossível. Sua sorte muda quando um poeta de nome Cléobe, de passagem pela ilha, se apresenta no casamento de um homem importante da comunidade – e o velho Leoprepes lá está como convidado, levando toda a família, até mesmo o filho feioso que geralmente é deixado em casa. O jovem acaba sendo aceito como ajudante e aprendiz pelo artista, e em sua companhia deixa Ceos, aos 14 anos, para tentar a sorte na carreira escolhida.

Cléobe vem a ser mais pai para Simônides do que Leoprepes alguma vez o foi, ensinando-lhe seu ofício com dedicação e paciência. Mesmo quando fica evidente que o rapaz é um talento dos grandes, jamais demonstra ciúme, nem qualquer receio de ser superado pelo discípulo. Natural de Éfeso, o velho bardo possui uma casa e certo patrimônio nessa cidade, mas a vida de um poeta, naquela época, era uma vida errante, sujeita a todas as agruras que podem atingir os que não têm pouso certo. Durante os primeiros anos a serviço de seu novo mestre, Simônides conhece boa parte da Grécia insular e continental, passa por apertos de todos os tipos, e, principalmente, aperfeiçoa sua arte, amplia seu repertório e conhece pessoas interessantes. Seu aprendizado prossegue em Éfeso, onde mestre e discípulo se fixam por algum tempo, e de onde acabam fugindo (assim como grande parte da população) por causa da ameaça da invasão persa. O novo domicílio dos dois é a cidade de Samos, na época, provavelmente, a mais rica do mundo helênico, embora não a de maior efervescência cultural: essa já era então, como ainda o seria por muito tempo, Atenas. Samos é governada pelo tirano Polícrates (a palavra "tirano", na origem, não tinha o sentido que hoje lhe atribuímos: significava apenas um governante que tivesse chegado ao poder pelos próprios meios, e não por herança ou por eleição regular). Lá, Simônides começa, aos poucos, a atuar de forma profissional, embora não de um jeito que seu mestre considere particularmente honroso: cantando numa taberna. Mesmo não sendo muito bem vista, essa ocupação lhe permite garantir seu pão de cada dia, e, não menos importante que isso, fazer muitos contatos, o que era outra coisa da qual um poeta grego daqueles tempos não podia prescindir.

Não obstante, é em Atenas, já com 20 e poucos anos, que o jovem poeta vê sua carreira decolar de verdade, em grande parte graças à proteção e incentivo de outro tirano, Pisístrates, que, no entanto, é muito diferente de Polícrates. Enquanto o tirano de Samos parece apadrinhar artistas da mesma forma como adquire objetos preciosos (ou seja, por mera exibição de riqueza e poder), Pisístrates é um real admirador das artes em geral e da poesia em especial. Há um trecho particularmente interessante, que reproduz uma conversa da qual participam o tirano, seu filho Hiparco, e Simônides, e que demonstra a preocupação dos dois primeiros com a preservação das grandes obras poéticas, que, na época, eram transmitidas apenas oralmente e conservadas de memória. Nunca passou pela cabeça de Simônides que as obras de Homero, por exemplo, pudessem ser perdidas – ele próprio sabe de cor a Ilíada e a Odisseia (que, juntas, têm mais de 27 mil versos), e, embora seja alfabetizado, jamais considerou a possibilidade de escrever nem os poemas que aprendeu, nem os seus próprios: para ele, a escrita é para fins práticos e prosaicos, como a contabilidade da fazenda de seu pai. Poesia deve ser guardada somente no espaço entre as duas orelhas, como ele diz; isso é questão de orgulho não só para ele, mas para a maioria dos poetas da época… E, se me for permitida uma observação pessoal, devo dizer que, embora ser capaz de declamar toda a obra de Homero de cor seja, sem dúvida, um feito formidável e digno de admiração, é difícil não ter vontade de xingar um pouco esses sujeitos quando penso no sem-número de obras deslumbrantes que certamente desapareceram para sempre, só porque alguém, um dia, por orgulho, recusou-se a registrá-las por escrito. Baquílides, sobrinho e discípulo de Simônides, parece ter sido um dos primeiros poetas a romper com esse preconceito e passar a escrever, o que o tio acaba aceitando, sem nunca verdadeiramente aprovar.

(Observe-se também, apenas de passagem, que "entre as duas orelhas" é um anacronismo de linguagem, pois, na época, ainda não se sabia que o cérebro era o responsável pela inteligência e pela memória; a teoria mais aceita era a de que essas funções fossem do coração. Quanto à questão de para que o cérebro realmente servia, as opiniões se dividiam. Aristóteles, um dos maiores filósofos gregos, que viveu cerca de um século depois do tempo de Simônides, acreditava que ele funcionasse como uma espécie de radiador, dissipando o excesso de calor do organismo; outros atribuíam à massa cinzenta funções ainda menos nobres, como a de produzir o muco que lubrifica nossas vias respiratórias.)

Pisístrates é um governante justo, que ganha a admiração e o respeito de Simônides, assim como da maior parte dos atenienses, e, quando morre, seus filhos parecem ser capazes de, juntos, dar continuidade ao trabalho do pai. Eles recebem o título de arcontes – o arcontado era uma assembleia formada por nove cidadãos eminentes, que partilhavam entre si as responsabilidades do governo –, embora todos saibam que têm, na prática, muito mais poder que seus pares. Hípias, o mais velho, é mais sisudo e preocupado, enquanto o outro, Hiparco, é um homem que gosta de aproveitar a vida e de cercar-se de companhias agradáveis. Não que seja dado a orgias ou excessos, pelo menos não de modo habitual; Simônides o estima, e, aos poucos, a relação de ambos extrapola a de artista e mecenas, transformando-se em verdadeira amizade. Não há motivo algum para que o poeta se importe com a queda que Hiparco tem por belos rapazes, nem com o hábito dele de ter sempre um favorito partilhando de seu divã nos banquetes, e, mais tarde, sem dúvida, também seu leito. Esses favoritos estão sempre mudando, cabendo a cada um deles um "reinado" de poucos meses, de modo que, por tudo o que Simônides pode ver, seu amigo não tem propensão a formar laços sentimentais, e ainda menos a qualquer tipo de fixação ou obsessão. Porém, os seres humanos nunca deixam de nos surpreender, e isso era tão verdadeiro na Grécia de 2500 anos atrás quanto o é hoje.

Na época em que Simônides viveu, relacionamentos homoafetivos eram vistos com naturalidade entre a alta sociedade (não entre a população em geral) na maioria das cidades gregas, mas existiam certas regras não escritas que deviam ser observadas. Havia uma distinção bem clara entre "amante" e "amado". O amante (erastes) era um homem adulto, normalmente na casa dos 30 ou 40 anos, já estabelecido socialmente e quite com a obrigação de assegurar a continuidade da família – quer dizer, geralmente um homem casado e com filhos. O "amado" (eromenos – pronuncie como proparoxítona) era um efebo (adolescente). O primeiro oferecia o afeto, o segundo o recebia – não era uma via de mão dupla, ao menos não em teoria. Não era bem visto que o parceiro mais jovem correspondesse; ser alvo das atenções do mais velho era visto como uma honra, especialmente se ele fosse alguém de alta posição social, mas não como um prazer. Se a reciprocidade existisse, era de bom tom que só fosse manifestada em privado. Tais relacionamentos podiam, ou não, incluir intercurso sexual. O mais importante era o que o eromenos podia aprender com o erastes, principalmente no que se referia a aprimorar o traquejo social, a conhecer pessoas e ingressar em certos círculos, o que iria repercutir em toda a sua futura vida social – ter um erastes com influência e contatos podia colocar o jovem no caminho de uma carreira bem-sucedida. Por fim, era considerado louvável que o erastes mantivesse uma visão realista das coisas, abstendo-se de se apaixonar pelo jovem parceiro, uma vez que esse tipo de relação tinha prazo de validade, devendo acabar quando o rapaz deixava a puberdade, já que, a partir daí, ele passaria a ter outras coisas das quais se ocupar, como a carreira e o casamento, até chegar aos 30 e poucos anos, idade em que estaria apto a tornar-se erastes de seu próprio eromenos. De qualquer forma, o normal era que uma ligação desse tipo durasse alguns anos; não era frequente que um mesmo homem vivesse a experiência mais que duas ou três vezes ao longo da vida, pois não era visto como adequado continuar a ter esse comportamento depois de uma certa idade. A alta rotatividade de favoritos no divã de Hiparco era uma exceção, tolerada porque naquela época, como hoje, os poderosos eram vistos como pessoas a quem era permitido transgredir certas convenções.

Simônides, ao menos na versão de Mary Renault, não se envolve com nada disso – sua conduta parece ser estritamente heterossexual, seja por ter sido criado em meio aos costumes austeros de Ceos, ou apenas por uma questão de preferência pessoal. Mesmo suas relações com mulheres não são muitas, em parte devido a sua intensa dedicação a sua arte, em parte por causa de traumas da juventude, ligados à rejeição que não poucas vezes sofreu por causa de sua feiura – que, aliás, em sua opinião, teve o lado bom de mantê-lo fora da mira dos apreciadores de efebos. Porém, ele acaba sendo testemunha de uma ocasião em que uma relação erastes/eromenos abalou a sociedade ateniense. Os protagonistas do episódio são o jovem Harmódio, filho de uma família ateniense antiga e tradicional, e Aristogíton, atleta de certo renome. Harmódio é de uma beleza extraordinária, o que nem sempre é uma sorte; em seu caso, atraiu o azar de chamar a atenção de Hiparco, que fica obcecado pelo rapaz, a ponto de aparentemente já não comer ou dormir direito (observações de Simônides, a cujos olhos atentos não escapa a aparência abatida e febril de seu amigo). Seja porque seu coração já pertence a Aristogíton, ou porque lhe repugna a ideia de ceder ao assédio de Hiparco a troco de ascensão social, ou simplesmente porque o arconte não lhe agrada – e talvez por tudo isso –, o fato é que Harmódio repetidamente repele as investidas amorosas que vai recebendo, o que acaba levando Hiparco ao desespero, e a chegar a um ponto do qual Simônides jamais o julgaria capaz: o de tentar vingar-se do jovem adotando represálias contra sua família. Isso tudo conduz a um desenlace desconcertante e terrível.

O livro termina com esse incidente, que teve lugar quando Simônides tinha pouco mais de 40 anos, sendo que ele viveria até próximo dos 90; o poeta ainda viajaria muito, viveria em diferentes lugares (Tessália, novamente Atenas, e por fim a Sicília, na época colônia grega, onde terminaria seus dias) e foi contemporâneo de muitos eventos importantes da história grega, além, é claro, de ter composto inúmeros poemas, que, infelizmente, nunca leremos. Portanto, se Deuses e Heróis tem um defeito, é o de ser curto demais. Acompanhar a prosa de Mary Renault é um prazer difícil de descrever, especialmente numa boa tradução, feita por alguém que, mais que o mero domínio das línguas inglesa e portuguesa, também tinha cultura para compreender as inúmeras referências históricas e mitológicas presentes no texto, e tratá-las de forma adequada: registro aqui todo o meu respeito ao Sr. Donaldson M. Garschagen, um tradutor de verdade, de um tipo que quase não existe mais. Também cabe avisar que essa mesma cultura, bem como a capacidade de apreciar uma linguagem elaborada, será muito útil a quem desejar ler o livro.

O fato de Simônides ter vivido durante um dos períodos mais importantes para o desenvolvimento intelectual da Grécia não passa em branco. Ao longo da narrativa, o protagonista tem oportunidade de interagir com um expressivo punhado de figuras relevantes: poetas como Laso, Íbico, o já citado Baquílides, e, de modo especial, Anacreonte, este um de seus melhores amigos; o arquiteto e escultor Teodoro; o filósofo e matemático Pitágoras; e o dramaturgo Ésquilo. Todos pessoas reais, alguns mais famosos, outros menos, mas todos tendo contribuído de forma valiosa para o engrandecimento da cultura grega, e, por consequência, de toda a cultura ocidental – na época, hoje e para sempre.

Uma curiosidade final: entre as lembranças esparsas que vão surgindo enquanto ele conta sua história (algo que esperaríamos de um homem idoso), o Simônides de Mary Renault nos oferece uma versão um pouco diferente da história do banquete de Escopas, que eu contei no início deste post; uma versão mais simpática a Escopas, e na qual o elemento sobrenatural aparece atenuado, de modo que o leitor pode, se o preferir, atribuir a salvação da vida do poeta a uma coincidência providencial. Se admitirmos que essa versão foi a que de fato aconteceu, então aquela outra certamente recebeu uma adaptação, destinada a fazer dela uma fábula com conteúdo moral. A verdade nunca será conhecida, mas, seja como for, eu me permito ter a opinião de que a versão que contei é mais bonita.

E agora é para concluir mesmo: o título original do livro é The Praise Singer, e existe uma outra edição brasileira, da editora Siciliano, que adotou a sua tradução literal, chamando-se O Cantor do Prazer. Eu prefiro o título da edição que tenho, a mais antiga, da Nova Fronteira, publicada em 1984, pois, embora não tenha nada a ver com o título original, ele reflete melhor o espírito da obra de Simônides, que passou a vida cantando sobre deuses e heróis, enquanto O Cantor do Prazer faz parecer que ele se dedicava à poesia erótica… Como eu já escrevi antes, o mais literal nem sempre é o melhor.

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